domingo, 6 de fevereiro de 2011

Volume importado cresce quase quatro vezes acima da produção

Em 2010, dois de cada dez produtos industriais consumidos no Brasil foram importados. Há sete anos, no primeiro ano do governo Lula, essa fatia era pouco superior a um, segundo cálculos da LCA Consultores. O volume de importações cresceu 37% no ano passado em relação a 2009, um ritmo quase quatro vezes mais rápido que a expansão de 10,5% da produção industrial na mesma comparação.

O crescimento da indústria foi o mais elevado desde os 10,9% de 1986, mas o resultado exuberante do conjunto mascara a expressiva queda de dinamismo ocorrida a partir de abril, refletindo a perda de espaço para os produtos fabricados no exterior e, em menor medida, a demora de parte das empresas para ajustar os estoques.Nesse cenário de explosão de importações e ritmo mais morno da produção local, a participação dos produtos estrangeiros no consumo interno de bens industriais atingiu o recorde de 20,1% em 2010, mais que os 16,3% de 2009 e os 17,3% de 2008, de acordo com a LCA. No quarto trimestre, a fatia dos importados alcançou 21,4%.

No último mês de 2010, a produção recuou 0,7% sobre novembro, feito o ajuste sazonal, um número muito diferente das projeções dos analistas que esperavam uma expansão próxima a 1%. O desempenho foi decepcionante em todos os setores da indústria nessa base de comparação: a fabricação de bens de capital recuou 0,5%, a de bens duráveis, 0,6%, e a de sem e não duráveis, 0,4%, enquanto a de intermediários ficou estável.

O volume importado, que crescia a um ritmo bem mais forte que o da produção em 2008, teve uma queda expressiva em 2009, de 17%, um reflexo do desaquecimento da economia num quadro de crise global. Foi um tombo superior aos 7,4% registrados pela produção. No ano passado, porém, com a retomada da atividade econômica e com a ajuda do câmbio valorizado, as importações voltaram a ganhar terreno, avançando muito mais rapidamente que a indústria local (ver gráfico). As compras externas de bens intermediários (insumos e matérias-primas para a indústria) aumentaram 39,7%, bem mais que a alta da produção local desses produtos, de 11,5%.

O economista-chefe da corretora Convenção, Fernando Montero, acredita que o forte aumento das importações é a principal explicação para o desempenho mais fraco da indústria, que não consegue superar o patamar atingido no pré-crise. Ele destaca, por exemplo, o descolamento entre a produção industrial e o vigor das vendas no varejo. A indústria está apenas 2,8% acima do nível de três anos atrás, enquanto o comércio varejista ampliado (que inclui vendas de veículos e de material da construção) se encontra num patamar quase 30% maior. Segundo Montero, os resultados das contas nacionais corroboram a ideia de que os importados têm preenchido essa lacuna, mostrando o aumento da fatia dos importados.

O economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, também acredita que as importações estão tomando mercado da produção local. Ele observa que a indústria está em estagnação há meses, ao mesmo tempo em que há um forte aumento de compras externas. Para Gonçalves, isso poderia tanto refletir que a produção não consegue crescer mais por limitações físicas como o fato de que as importações estão "roubando" parte da demanda, movimento propiciado pelo dólar barato.

Como o nível de utilização de capacidade instalada e o da própria produção estão abaixo do patamar pré-crise, tudo indica que as compras externas têm ocupado espaço da indústria local, afirma ele, ainda mais num quadro de provável aumento da capacidade produtiva, dada a maturação de investimentos.

Os níveis elevados de estoques também seriam um dos motivos para explicar a fraqueza da indústria a partir de abril, na avaliação de alguns analistas. Segundo o gerente da coordenação de indústria do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), André Macedo, alguns setores formaram grandes estoques para aproveitar o período de desoneração de tributos que vigorou até os primeiros meses do ano, o que também contribuiu para a acomodação da indústria no segundo semestre.

A economista-chefe da Rosenberg & Associados, Thaís Marzola Zara, vê com ceticismo o papel dos estoques na perda de força da indústria nos últimos meses. "Falar em ajuste de estoques por quase nove meses é complicado", afirma ela, que também vê mais evidências de perda de espaço para o produto importado. Como Gonçalves, ela lembra que a utilização de capacidade instalada está em níveis elevados, mas num patamar inferior ao das máximas históricas.

O economista Thovan Caetano, da LCA, diz que o câmbio tem dificultado a situação de alguns setores da indústria, citando os de material eletrônico e de comunicações e o de metalurgia básica (onde se encontram os produtos siderúrgicos). A produção industrial de material eletrônico e comunicações cresceu 3% em 2010, enquanto as importações desses produtos cresceram 38%. No setor, a fatia dos importados no consumo interno pulou de 45,3% em 2009 para 53,1% no ano passado.

No caso da metalurgia básica, a produção local cresceu 17%, um ritmo expressivo, mas muito inferior aos 75% registrado pelas compras externas. Com isso, a participação dos importados cresceu de 16,8% para 21,6%. (Colaborou Rafael Rosas, do Rio)

Fonte: Valor On Line

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